segunda-feira, 15 de outubro de 2012

DIA DO PROFESSOR


Hoje é dia do professor. A data anda meio esquecida – não pelos profissionais da área, mas por grande parte dos segmentos da sociedade brasileira.

Não é esse, certamente, o motivo para não celebrar – com júbilo – o fato de professar a profissão docente, que acontece no cotidiano das escolas, mesmo quando o mar pareça estar para poucos peixes.

É fato que alguns professores remam com os braços doridos, arrastados por ondas gigantes, solapados por ventos fortes, desanimados com a pesca diária. O arrastão nem sempre tem motivado a busca do bom pescado.

Há, também, aqueles que ainda vêem nos ventos oportunidades de mudanças e conseguem compreendê-las como necessárias à descoberta doutros mares, doutras terras, e, então, reaprender para decodificar outras cartas de navegação.

Há os que ainda se encantam com o mar, não menos do que com os peixes, e, nesse entrecruzar de encantamentos, tecem redes, trazem o pescado bom para o barco e o encaminha a inesperados destinos.

Um dia, desses marcados movimento da vida, no milagre da multiplicação dos peixes, o remador-ensinante encontra um peixe ali numa clínica, num escritório, numa loja, alguns na magistratura, na indústria, no esporte, no campo, e muitos outros que retornam ao grande oceano onde se aprendeu, para, então ensinar e atravessar canais, ondas e ventos novos.

Por isso, hoje é dia de festa e de vida! Dia do Professor, apesar das águas revoltas, dos peixes não fisgados e da própria necessidade de recuperar a identidade profissional. É feliz quem, ao viver da pesca, a ela dá, não tira o mar!

 

 

 

Texto originalmente publicado no Jornal Bom Dia Rio Preto – outubro de 2008

domingo, 7 de outubro de 2012

De portões fechados


Setembro: um mês esperado. Não explico o porquê da espera, mas neste dois mil e doze, minha espera por ele foi grande.  Possivelmente os dias quentes e secos de agosto forçaram tal espera ainda mais, talvez a esperança de um bocado de chuva, talvez dias amenos movessem a esperança por “entrar setembro”.
E os dias de setembro vieram. O ar continuou seco e pesado por uns dias até que a desejada chuva chegasse para dar ao mês a cara dele. E trouxe sorriso e trouxe frescor e trouxe chuva, vida, afinal.
Curiosamente, estava num período de final de férias e fiz uma única curta viagem.  De passagem pela região em que transitava, resolvi visitar o túmulo de um ente querido numa pequena cidade. O cemitério local não é do tipo marcado com tumbas imponentes e mausoléus elegantes. Não! Há algumas peças bem antigas que remetem ao tempo da história dormida da gente do lugar, alguns túmulos simples, mas revelam ali fotos de seus ilustres moradores.
A maioria das covas do lugar é identificada com placas discretas no chão, sem apresentar mausoléus ou imagens de santos suntuosas. Os túmulos mais antigos deixam letras, palavras e homenagens nas singelas lápides já quase se apagando. Tudo é muito típico da paisagem no lugar, muito verde, muitas árvores, inclusive uma seriguela em frutos, percebi de minha última estada. Como a pequena cidade, o seu cemitério parece revelar a vida daquela paragem.
Na entrada do prédio, um pouco distante do centro da pequena cidade, uma placa sinaliza que o espaço público é aberto diariamente à visitação, das 08h00 às 17h00 horas. Cheguei bem defronte do portão e vi que ele silencioso velava pelo silencio do lugar e ainda eram 16 h e 30 min. Estranhei o fato e até imaginei que fosse feriado na cidade, em plena segunda-feira. Resolvi descer as ruas das cercanias e perguntar a algum vizinho sobre o ocorrido, mas não havia nenhum vizinho à vista ou em casa.
Desci um pouco mais a rua e vi três rapazes ao redor de um carro. Pensei comigo que eles talvez soubessem algo. Ao perguntar-lhes eles disseram ter visto os dois funcionários descendo ao Almoxarifado da Prefeitura alguns minutos antes e sinalizaram que eles ainda estariam por perto.
Resolvi acompanhar o cortejo dos dois funcionários que, segundo informaram, estavam de bicicleta, mas que eles a empurravam, não a montavam, logo a razão de não estarem longe dali. Alcancei os moços e perguntei-lhes sobre a razão do fechamento do campo santo, ao que me disseram que doravante o lugar fecha mais cedo, pois os funcionários precisam bater o ponto e ir embora.
Ao conversar com eles disse que a placa marcava dezessete horas o tempo de fechar as portas. Eles disseram que era a nova lei. Perguntaram se era algum sepultamento ou afim, e respondi que apenas queria levar flores e visitar um túmulo de parente.
Um deles se prontificou a voltar. Minha mulher ficou com dó e não achou justo tirar o sossego dos rapazes ao final de um dia de labuta. Mas, negociou pedindo a chave do cadeado do portão principal emprestada que, de pronto foi atendida.
Perguntei o nome dele e pedi que me esperasse que retornaríamos antes das dezessete a fim de não causar atraso (supondo-se que a jornada de trabalho se encerra às dezessete horas). Ele anuiu, disse-nos o seu nome.
Refeitos, fomos à visita breve e com o compromisso de devolver a chave tão gentilmente emprestada. Curioso foi que, tão logo chegamos ao lugar, minha mulher abriu o cadeado e deixou-o com chave e tudo junto à corrente.
Entrei em seguida e vi a cena. Como o seguro morreu de velho, retirei chave com cadeado e tudo e entrei no lugar para minha parte na visita. Não se passaram cinco minutos, percebi que entrava no lugar um cidadão com cara de contrito.
Pensei: - este está como nós, deve ter sido vítima da antecipação do horário e veio visitar alguém.
Retirei-me do lugar e minha mulher ficou por lá ainda fazendo suas orações e adornos no vaso do túmulo visitado. Passei pelo cidadão que me se apresentou como Presidente da Câmara e perguntou:
- Quem lhes entregou a chave do portão?
- Respondi-lhe que foi um funcionário (Nesta hora é bom ser apenas funcionário para não ser responsabilizado). Como era tempo de política, fiquei esperto e reduzi todas as possibilidades de informação, vai que por um lapso a oposição e a situação se peguem numa questão de vida, justamente pelo portão do cemitério, a coisa ficaria preta para alguém.
Pediu-me a chave: eu disse que cabia a mim devolvê-la e esperei que o homem, agora com cara menos contrita retornasse da visita que ele disse que faria. Vi que ele ligou o celular e falou com alguém. Esta visita parecia mais viva do que a cena apontava.
Em alguns minutos ele retornou. Passou por nós. Minha mulher já andava um pouco apreensiva e temerosa de que o funcionário X, se descoberto, poderia ser a vítima do portão fechado.
O Presidente disse que se eleito entraria em seu oitavo mandato como vereador. Deu um até logo e saiu com seu carro estampando o nome do candidato a Prefeito e o dele. E foi-se embora vagarosamente como a vida do lugar.
Zarpamos para o Almoxarifado. Lá não estava nem X, que dirá o companheiro Y. Entreguei a chave a um grupo de funcionários que estavam sentados esperando a vida soar dezessete horas
Não sei mais nada, além disso. Fiquei a imaginar o que tivera passado pela cabeça do homem da casa das leis, o que pensava X sobre o episódio chave e a dos colegas de ofício ali sentados. Suponho que alguém imaginou ser a TV ou um jornal ali espionando a lentidão da vida que pulsa na cidadezinha, onde a política, nesta época, é quem dita o ritmo e dá um movimento diferente ao ambiente, ainda que seja preciso abrir o cemitério após o expediente.
 
São José do Rio Preto, 07 de outubro de 2012. Dia de eleições municipais.