segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Ser avô: a felicidade em resgate


São José do Rio Preto, 25 de fevereiro de 2013. Um dia quase normal, não fosse a anunciação do nascimento de Théo de Faria Escabin, meu primeiro neto. Que alegria! Não nos lembra, na família, alguém que aniversarie neste mês, exceto a avó paterna do menino, a querida, agora também, avó Maria Eugênia.
Desde o dia em que seus pais, Liza Mirella e Paulinho Escabin, data em que eu completava sessenta anos, em 04 de julho de 2012, me presentearam com a notícia de que estavam grávidos de amor e você seria o filho e o neto amado, fiquei imaginando o que viria a seguir ao longo dos meses entre aquela e esta ocasião.
Para te saudar, pequeno Théo, valho-me da literatura rosiana com o diálogo de uma mulher que colocava seu filho no mundo, ali no sertão, diante de Diadorim, que lhe disse, de saída:
— “Minha Senhora Dona: um menino nasceu — e o mundo tornou a começar!" e ele saiu para as luas.
O dia de hoje é de travessia, ainda a associar a alegria do nascimento de Théo ao grande poeta Guimarães Rosa. As veredas se abrem para a chegada do menino que faz o mundo recomeçar e ele, poder, alegre, saudável, amado, educado por seus pais, trafegar pela vida e, como tal, poder desvelar o sentido maior de seu itinerário, sua viagem, a viagem de Théo.
Às dezoito horas e dois minutos desta segunda-feira, vinte e cinco de fevereiro, acabou de nascer uma luz: a luz da travessia do menino. Luz esta preparada com o  encanto, com a magia, com a alegria para desejar muito o recomeço do mundo.
A luz nasceu do fruto de dois corações amantes, os pais do menino que, pela arte de amar, acreditaram e convidaram o mundo a ser melhor. Assim, juntos seus pais traçarão com ele novas veredas, pela explicitação da melhor maneira de amor-amar, em processo que nunca finda, apenas aumenta o espaço de bem querer do coração. Um amor em dois, multiplica-se: são, agora três.
Ainda que pareça ridícula, a declaração de amor que faço como avô, assim como as cartas de amor, não são. Apenas uso a prerrogativa do direito de ter me tornado avô aos sessenta anos, divorciado do que Rachel de Queiróz diz sobre o fato de o fenômeno acontecer aos quarenta ou quarenta e cinco anos, quando se sente nos ossos que o tempo passou mais depressa do que se esperava e, de repente, se envelheceu e eis que chega a hora de ser avô, o tempo de, pelo menos, tentar não parecer/ser ridículo. O menino, um dia, entenderá que esta declaração a ele é de amor profundo, não absurdo. 
Por mais estranha que seja a declaração de amor ao neto que chegou hoje, talvez entendida como coisas da velhice, não importando, como diz Queiróz, envelhecer. Esta idade tem suas alegrias, suas compensações, que, embora não provadas ainda, acredita-se nelas.
O bom de tornar-se avô é poder contar com a possibilidade de fazer uma viagem ao tempo e recortar dele, a nostalgia da infância e da juventude, e lembrar, carinhosamente de como foram bons os avós que a gente teve. Como me lembro da doçura de minha avó Alvina, sempre envolvida com carinhos de cozinheira a tratar bem dos netos e dar um jeito nas panelas, seja pelo ato de adicionar e mexer farinha – como ela sempre dizia - e saciar a gula da ninhada de netos.  
Como se esquecer da firmeza de minha avó Maria Amélia – uma guerreira – dona da situação – favorável ou não - sempre pronta a socorrer, a orientar e dar um jeito na indigestão com losna ou arruda e curar a gula que já viera da casa da outra avó. A avó que acolhera este neto antes de seu nascimento e que o tivera criado, não fosse o dom supremo do amor que une e reune as pessoas.
O que dizer de meu avô João, apelidado de João Bom, tão bom que foi na vida, diante de tanta delicadeza. Lembro-me, como neto, que fui o escriba dele por anos. Escrevia, a exemplo da Dora, protagonista do filme Central do Brasil, as cartas de meu avô a seus parentes na Bahia. E como eram longas as cartas. E como foram tantas as lembranças e recomendações dadas aos seus entes queridos. E não adiantava cortar a carta, havia o momento da leitura para a revisão em coautoria. Talvez, a bondade e os olhos azuis de meu saudoso avô tenham enxergado o escritor que insiste em fazer-me crer que a literatura é uma infinita fábrica de mel, como diz M.M. Soriano, pelo ato de juntar as letras, que são abelhas, às palavras que são enxames.
Passei o posto de escriba de meu avô, um dia, a minha irmã Eliane, quando segui minhas veredas rumo à profissionalização e ao encontro de meu casamento, de meus filhos. Saudade nostálgica e grande também de meu avô Marcelino, que, quase sempre, diante do cinto ou do relho de meu velho pai, o tentava ensinar um pouco mais com sua voz cândida de bom avô: não bata no bichinho não! Quer melhor do que isto?
Não há declaração de que avô seja ridícula! Pelo fim de tal marca aos avós do mundo. Aos tios, aos irmãos e a quem mais professe a alegria de curtir e compartilhar o amor que tenha!  
Doravante, como minha proposta ao pequeno Théo é de amor, sem ser ridículo, tentarei não cair na tentação de dizer, à beira do berço ou do carrinho, ou diante do berçário que o menino é isso ou aquilo, que se parece com quem quer que se assemelhe. Tentarei disfarçar, para não ser tomado por ridículo, ou babão, como muitos dizem sobre os avós, as efusões e arroubos de vaidade em relação ao mais novo membro da família. Mas, cá entre nós, que ele é lindo é.
E a vida, de repente, reacontece, reaparece, ressurge. Eis que é chegado o dia de ser avô. Diferente do tempo de ser pai, em que as coisas acontecem e têm de acontecer, a ponto de transformar toda a vida de mãe e de pai, simplesmente. Ser avô e declarar-se (ainda que muitos tomem por corujice, babonice ou ser ridículo) é tempo de amar acumuladamente ao longo do que se aprendeu ao criar os filhos, com erros e com acertos, medos, sobressaltos e com a alegria que o ato envolve. 
Ser avô, ser avó é usufruir o tempo da ocupação de corações mais brandos, mais vividos, mais experientes para olhar o neto e o filho noutras dimensões. O que fiz de errado que meu/minha filho (a) repete? Como não interferir e implorar que “não se bata no bichin”, como não deixar lambuzar-se de doce, de chocolate, de pirulito e permitir aventuras tão distintas das que, em casa, com os pais são tão definidas? Isso é ser avô, de repente, e fazer vicejar novas doses de amores.
Trago em cena, novamente, a farinha de minha avó Alvina, mágica para um mexido bom. Como era gostoso sorvê-la, mas, com todo o carinho de vó, nunca quebrar a “trevessinha de loiça” de estimação como eram todas as suas vasilhas da velha e repleta cristaleira de outrora. Um dia, menino ladino – como minha avó me chamava – acidentalmente, tenho a certeza, deixei cair a travessa, que se partiu na travessia dos objetos. Minha vó ficou triste, mas nem um pouco menos amorosa do que era. Isso é ser avó, vovó Alvina. 
Pequeno Théo, que você percorra seu sertão, suas veredas, junto de seus pais, de seus avós Sueli, Maria Eugênia, Elísio e Paulo. Percorra-o, com saúde, com alegria, com longevidade, com carinho, com amor em seu coração. Distinga o bem do mal, como seus pais ensinar-te-ão. Percorra o sertão, como diz o poeta Rosa, questione, pergunte, mesmo que a resposta se oculte. Eis aí o segredo de uma viagem reveladora, comprometida, plena de cumplicidade e de amor com os seus familiares e os amigos que a vida lhe acrescentará.
Caro neto, o poeta Manoel de Barros sinaliza: as coisas não querem mais ser vistas por pessoas razoáveis: elas desejam ser olhadas de azul – que nem uma criança que você olha de ave. Que você olhe o mundo, sua travessia com muito azul. Seja feliz, querido Théo. E que este seja um entre tantos presentes a receber pela vida afora.
ET – querido neto, escrevi esta carta antes de vê-lo. Imaginava você apenas, curtia-o. Vê-lo, foi uma sensação indescritível. Junto de seu pai, ao lado do berçário, abraçamo-nos e choramos a alegria de sua chegada.
Um abraço grande, meu querido neto,
Seu avô,
Elísio Vieira de Faria.

14 comentários:

  1. Parabéns meu Grande amigo Elisio, Tem um provérbio Indiano muito clichê mas que cabe como uma luva neste momento;
    Enquanto nascer uma criança é um sinal que Deus ainda confia
    na Humanidade...

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    1. Betão, a amaior alegria que vivi, não sei qual foi, mas o nascimento deste menino muito me tocou. Estou em transe. Deus existe e permita que vivamos para ver nossas obras crescerem e multiplicarem. Valeu tê-lo conhecido em Sampa e ter aberto nosso coração a esta boa amizade. Abraços a vc e a Maroca querida.

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  2. Parabéns! Transmita nossos parabéns à Sueli e aos pais do Théo!
    Verás, é uma delícia ser avô! Hassan fez 4 anos dia 17. Fiquem com Deus! Ficamos e estamos felizes com a notícia! Grande abraço! Dely e Nelson

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    1. Obrigado, padrinhos queridos. Estamos colhendo os frutos do amor. Deus seja louvado. O menino é lindo, saudável e nos dá força a continuar a luta. Abraços a todos.

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    1. querido genro, aqui, todo o amor que lhes tenho..... em prosa..... ontem foi um dia mágico. Faltou tomar uma junto contigo.... fico devendo uma daquelas que o Gui separou em nosso último encontro.
      abraço.

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  4. Elísio, querido.... Lindo demais... PARABÉNS pelo NETO e pela grandeza na alma... vc é especial!

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    1. Obrigado pelo carinho, Silvana. Você é também especial e o escritor só tem inspiração, motivado pelo leitor. Bjs. O dia de ontem me foi especial. Creia.

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    2. Linda a carta que você dedica a seu neto. Linda a sua declaração de amor. Tão lindo quanto ambos é o exemplo que você lhe dá, do que se pode fazer com as palavras, quando elas saem do coração. Parabens vovozão!

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    3. Obrigado, Sílvia, emocionanetes suas palavras. O que alimenta a inspiração. Um abraço.

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  5. Ao Marcos Rogério Oliveira de Moraes, meu sobrinho, que aniversaria no finalizinho de fevereiro, com pedidos de desculpa por meu ato falho.

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  6. Cinco anos depois. Como sufocar as emoções vividas sem resgata-las?
    Ah, como é bom envelhecer e ter o privilégio de ser avô!

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